Semana passada, em clima pré São João, terminamos um pequeno road trip de 660 quilômetros de estradas ao redor da Chapada Diamantina. Visitamos juntos Lençóis, a cachoeira do Sossego, Igatu, Mucugê, o Buracão, o Vale do Capão e a cachoeira da Fumaça, a segunda maior do Brasil.
Confira então aqui este relato que é dedicado ao fã número um (talvez fã número único deste blog). Aquele que sempre comenta os artigos e compartilha as publicações no Facebook. Você, que veio me visitar aqui por 6 dias. Agora, é minha memória que te visita, a você e aos outros leitores interessados:
Quis te mostrar o meu mundo, a minha maneira de viver já que é comum que os pais tenham ideias preconcebidas sobre os filhos.
No primeiro dia, te mostrei o lugar onde vivemos, eu e Katherine. Como trocamos trabalho por aluguel na Associação Casa Grande. Com as crianças que precisam e querem ter mais educação, estamos criando atividades interativas com algum conteúdo útil e, ao mesmo tempo, alguma diversão.
Te mostrei que reciclamos as frutas e verduras da feira. As frutas que provavelmente não sejam escolhidas fazem umas boas vitaminas que até dispensam o açúcar. As verduras amassadas nutrem bem mais que carne e pão.
Enfim, nossas despesas são organizadas e controladas e nosso trabalho improvisado. Para diminuir os custos, nossos e ao planeta, e se libertar das garras apodrecidas do mercado de trabalho brasileiro.
Enfim, logo no segundo dia fomos, você e eu, fazer a trilha da cachoeira do Sossego. Uma caminhada que é um desafio para a maioria das pessoas ainda jovens. A trilha, com suas fortes subidas, é um caminho mal sinalizado e boa parte dele é feito pelo leito do rio pulando entre pedras. Nesse dia choveu bastante e o nível do rio estava alto, ou seja menos pedras estavam visíveis para serem pisadas, e as que restavam; cobertas estavam de um musgo traiçoeiro.
Foi com dificuldade e alguns escorregões que chegamos ao imenso poço de águas negras. Tão forte era o volume de água solto através da fenda que fazia correnteza.
Nadamos por ali até chegar embaixo da queda e sentir o forte deslocamento de ar que o canhão de água cria. Mas o dia estava escuro e a água estava gelada. Então, saimos logo dali e sentimos, no caminho de volta, a força da correnteza das águas nos empurrando para as paredes de pedra. Nadamos de volta rápido para onde deixamos as mochilas. Era hora de um descanso, umas frutas e biscoitos de almoço. Logo, seria hora de fazer os quatro quilômetros de trilha de volta para Lençóis.
No terceiro dia descansamos. Deu para dar uma volta em Lençóis, no centro e na bela natureza que fica ao redor. Almoçamos no que deve ser o melhor PF de Lençóis, pela comida e pelo atendimento, no restaurante da Bete, na rua das Pedras.
Quarto dia. Alugamos um carro para ir visitar a cachoeira do Buracão, perto de Ibicoara. Nesse dia fomos visitar cidades históricas da região.
Igatu é realmente uma pedra preciosa encrostada no alto da montanha. Para chegar lá são sete quilômetros em estrada de pedras cortadas à partir do desvio da rodovia pouco depois de Andaraí. E são pedras mesmo, grandes e cortadas de maneira rudimentar. Só o caminho já é impressionante.
Subimos a montanha e voltamos no tempo. Primeiro a 1980, observando os equipamentos eletrônicos do centro de informações turísticas e dos comércios da praça:
Logo a 1900 nas ruínas da vilazinha que já teve 9 mil habitantes, cabaré, cinema e lojas de produtos importados. Hoje Igatu tem 382 habitatantes e nenhum serviço de transporte a lugar nenhum.
O título de Machu Picchu baiana é, no mínimo, um exagero mas a cidade é mesmo um lugar místico, um imenso museu aberto. E a galeria Arte e Memória, próxima às ruínas, é lugar que não deveria ficar de fora de nenhuma volta à Chapada Diamantina.
É importante entender a horrenda história da mineração que quase secou um rio antes navegável, que usou até o fim milhares de pessoas com o propósito de construir lá longe o metrô de Londres e o canal do Panamá, servindo a interesses alheios a esta terra.
Em Igatu ainda, visitamos uma antiga mina de carbonato, o verdadeiro diamante negro. Escavada a mãos, martelos e picaretas. Lá dentro, além de uma escuridão total, haviam bonecos de argila colocados deitados em quadros de madeira. Cada um deles dedicado a um homem diferente. Todos estes uma vez retratados numa fotografia antiga. Se trata da última lembrança e homenagem aos homens que uma vez aqui gastaram suas vidas para extrair o minério precioso.
A gruta, feita por mãos humanas recebe todos os anos uma procissão de mulheres cobertas de um longo lençol branco que passam por toda a vila recolhendo as almas dos mortos e levando os para um bom caminho, a igreja.
Saímos logo da cidade fantasma para ir a Mucugê. Uma vila muito colorida que já estava toda decorada para São João. Passamos aí uma noite animada ao som de muito forró comemorando o lançamento de uma cerveja artesanal local.
Quinto dia, levantamos bem cedinho para tomar café da manhã e descer das alturas da Chapada dirigindo pelas áreas planas que já não fazem parte do Parque Nacional e por isso repletas de plantações de soja circulares, visivelmente consumindo a maior parte da água que sai da Chapada pelos rios. Barram o fluxo dos rios, irrigam muita água a imensos guindastes que dão volta como as agulhas do relógio regando as plantas, que depois, provavelmente vão dar de comer às vacas chinesas.
O clima era bom e a estrada bem reta, bem cuidada. O velocímetro subia sem muito esforço e logo já estávamos na frente da agência Bicho do Mato, onde pegamos um guia, o Cristiano, meu xará! É obrigatório visitar o Buracão com um guia local. O custo foi de 46 reais por pessoa (guia+taxa de conservação).
De Ibicoara são 30 quilômetros de estrada de terra em péssimo estado de conservação. Depois uma hora de caminhada bem fácil até o Cânion por onde passa a água do rio e entra por um buraco na terra de 90 metros de altura. E para entrar nesse buracão só nadando por um outro cânion que é uma verdadeira obra de arte da natureza.
Chegando ao Buracão, o fluxo de água era forte. O sol, lá no alto, bem quente mas a verdade é que chove em todo o Buracão. Nadar ali, naquele dia dava a impressão de estar num oceano durante uma tempestade. Muitas ondas batendo no rosto.
Para voltar a Lençóis foi longo. Voltamos pela trilha e depois cinco horas para chegar em casa. Mas valeu.
Enfim, o último dia a nossa volta a Chapada dedicamos a ir conhecer a feira do Vale do Capão e a cachoeira da Fumaça.
Depois de visitar a feira era hora de uma bela caminhada subindo um grande desnível de montanha no sol forte depois de comer muito no almoço. Apesar disso a surpresa foi positiva: Tivemos essa beleza da natureza para aproveitar sozinhos. Não havia ninguém naquela imensidão de lugar à tarde. Passamos horas admirando o vale e apreciando o silêncio absoluto.
E assim, terminou nossa aventura. Fazendo parte do espetáculo do pôr do sol visto sobre o Vale do Capão.
Valeu Cris, bonitas palavras, queria que mais gente aprecia-se esse modo de vida, bonito e corajoso, que bom que fizemos estes passeios, vimos estas maravilhas ainda preservadas e acolhedoras, ainda faltou falar que descemos a do meio de escorrega, vimos as areias coloridas de Lençóis, aquele almoço gostoso do vale do capão, aquele bolo que vc fez, o acaragé com os amigos, a cachaça de jabuticaba, a aula de malabarismo o caminho errado na volta da cachoeira da fumaça, os lanches, os caldos de cana, etc etc.. Gostei do texto, das fotos, até a próxima, com saudades.
CurtirCurtido por 1 pessoa